segunda-feira, 5 de setembro de 2011

D. José deixou-nos uma mensagem de Roma

Caros amigos e amigas
 Saúdo com viva simpatia as iniciativas da página www.graodeamendoeira.com e a página do facebook e outras em curso criadas e mantidas por um grupo de amigos liderado pelo Pe. António Pires e pelo Miguel Miranda. Estas iniciativas constituem para mim uma alegre e agradável surpresa em ordem à preparação da Ordenação episcopal e início do Ministério pastoral do 44º Bispo da Diocese de Bragança-Miranda. O Santo Padre, o Papa Bento XVI nomeou-me para tal serviço no dia da memória litúrgica de um grande Bispo, o Beato D. Bartolomeu dos Mártires (1559-1581), Arcebispo de Braga e ao tempo das terras do Sul da nossa amada Diocese. Este Pastor insigne escreveu a propósito do perfil do bispo: «três coisas se requerem no prelado: 1ª – pureza de intenção, que consiste nisto: desejar mais servir que presidir; procurar em tudo não a honra, não a própria comodidade, mas a pura vontade de Deus e a salvação das almas; 2ª – conversão santa e irrepreensível, para que de nenhum modo se possa objectar-lhe: médico, cura-te a ti mesmo; 3ª – humildade interior e sincera, para que não presuma interiormente ou se glorie da própria santidade, como usurpador e ladrão da glória que só a Deus é devida, em quem deve confiar e de quem deve depender»1. É um programa que abre à coragem da esperança. Já o grande Bispo, Santo Agostinho tinha referenciado: «como quer que sejamos, que a vossa esperança não esteja posta em nós: se formos bons, somos ministros; se formos maus, ministros somos. Mas só se formos ministros bons e fiéis, é que seremos verdadeiramente ministros»2. Caros amigos e amigas, a Igreja coloca-se numa atitude de serviço, que não impõe a fé, mas solicita a coragem pela verdade. «O Bispo torna-se “pai”, exactamente porque é plenamente “filho” da Igreja»3. A própria vida diz-nos que nem todos podemos ser pais, mas todos somos filhos….na confiança, qual dom de Deus. «Confiança, com efeito, é o nome infinitamente nobre que o amor assume neste mundo, quando a fé e a esperança se unem para permitir-lhe de nascer»4. Escolhi como mote do serviço episcopal: Ad dodendum Christi mysteria (para mostra os mistérios de Cristo). O único mistério de Deus é Cristo. «Único é o mystérion toû theoû (1 Cor 2,1; Col 2,2; Ap 10,7), ma as suas modalidades de expressão são as Escrituras e a liturgia, ou melhor ainda, a palavra de Deus contida nas Escrituras, o livro aberto pelo Cordeiro na liturgia (cf. Ap 5)»5. Este mesmo mistério é simbolizado pelo grão de amendoeira. Convido-vos a reflectir este texto de Frei Isidoro Barreira (séc. XVI-XVII - ? - 1634), no qual se dá um enorme realce ao significado da amendoeira, como a árvore vigilante e o seu fruto como símbolo da vida em Cristo: «A amendoeira é árvore, que na Sagrada Escritura se acha muitas vezes referida, encobrindo mistérios profundos, como ela sabe encobrir seu fruto e ser misteriosa nele. Assim o ter Jeremias aquela visão da vara vigilante6, que outra versão diz que foi Amendoeira, coisa foi que então lhe deu muito que em que cuidar (…) porque esta árvore não somente apregoa fertilidade em mostrar flores tanto na manhã da Primavera, mas também prognosticar fartura de pão, que esse ano se há-de seguir; porque escrevem os naturais, que quando virmos as Amendoeiras carregadas de fruto, depois que lhe cai a flor, é sinal de grande fertilidade, e abundância de pão, que esse ano haverá. (…) A amêndoa antes de ser madura, e prestar para se comer, cresce devagar, e está mais tempo na árvore, que os outros frutos, sendo ela a primeira que sai com flores, e ultimamente se recolhe. A sua casca interior é muito dura, e a de fora muito amarga, e enfim o fruto ainda que seja doce, não se chega a comer sem trabalho; o fruto que após a esperança vem, devagar vem, e mais tempo se espera do que se goza. Nunca esse chega sem ânsias e cuidados, porque vencida uma dificuldade, se levanta outra, após um inconveniente se segue outro, após uma tardança maior tardança. Assim que esse fruto se não colhe sem custar, e sempre custa muito, se se espera muito; muito cansa, se chega devagar. Basta dizer o Espírito Santo, que a esperança que se dilata, aflige a alma. Doce é a amêndoa, mas amarga na casca (…) Isso mesmo se deixa entender na vara que temos dito de Amendoeira, que Jeremias viu, a que ele chama Vigilante, vindo a concordar muito uma coisa com outra, porque como pela Amendoeira significa esperança segura, o mesmo é estar em vigia, que viver de esperanças, o mesmo é vigiar, que esperar; porque quem espera, sempre vigia com o pensamento(…) de sorte que vigiar, e esperar tudo é um e uma mesma coisa o ter visto Jeremias vara vigilante, que vara de Amendoeira. Senão quisermos dizer, que esta vara ele viu de Amendoeira, eram seguríssimas esperanças do Filho de Deus haver de encarnar cedo, e vestir-se de nossa humanidade, como alguns Autores querem que se entendam por Cristo nossa única esperança, aquelas palavras do Eclesiastes “florebit amygdalus” – “enquanto a amendoeira abre em flor” (Ecl 1,2), que querem dizer: florescerá a amendoeira. A qual tem cortiça amargosa, e o miolo saborosíssimo; e Cristo teve carne sujeita a amarguras, e teve Divindade cheia de toda a doçura. Esta singular Amendoeira então se diz que mostrou flores, quando refloresceu em sua gloriosíssima Ressurreição, sendo primeiro seca, mortificada, e abatida em sua santíssima Morte, e paixão»7. «Pois a amêndoa é fruto de muito mistério: na primeira casca amargoso, na segunda resguardado, e fortalecido, e no interior comer suavíssimo, que sustenta e conforta, dando saúde e vida. A cuz à primeira vista mostra trabalhos, e aflições, após isso já descobre fortaleza, e amparo, que é do género humano; é torre e castelo, e espada com que o Senhor sopeou o mundo, e triunfou dos inimigos: além disso é muito suave, e saborosíssima no fruto, que de si dá, como a Igreja canta em louvor da mesma Cruz, chamando doce Lenho, doce Planta, a que dá tão doce, e suave fruto: Dulce lignum, dulces clavos, dulcia ferens pondera. A casca da amêndoa trabalhosa é de quebrar, o fruto fácil de comer. O rigor da Cruz dificultoso é de passar, mas vencido ele, segue-se o gostar doçuras eternas, às quais ninguém chega sem esperanças, que sempre vai fundando na Fé, e caridade»8.
 Conto convosco no dia 2 de Outubro na casa de todos, que é a Catedral, para juntos continuarmos o caminho da confiança e da Esperança ao serviço da Igreja e do mundo de hoje. Cordialmente    José Cordeiro
1 BARTOLOMEU DOS MÁRTIRES, Stimulus pastorum.2 S. AGOSTINHO, Sermo 340/A, 9.3 J. PAULO II, Pastores Gregis 10.4 CHRISTIAN DE CHERGÉ E ALTRI MONACI DI TIBHIRINE, Più forti dell’odio, Edizioni Qiqajon, Comunità di Bose, 2010, 91.5 E. BIANCHI, «La comunicazione mistagogica simbolo e arte per la liturgia e l’evangelizzazione», in Rivista liturgica 98 (2011) 123.6 «Depois foi-me dirigida a palavra do SENHOR nestes termos: «Que vês, Jeremias?» E eu respondi: «Vejo um ramo de amendoeira. «Viste bem - disse-me o SENHOR - porque Eu vigiarei sobre a minha palavra para a fazer cumprir.»» (Jer 1,11-12).7 I. DE BARREIRA, Tratado das significações das plantas, flores, e frutos que se referem na Sagrada Escritura, Alcalá, Lisboa 2005, 192-194.8 I. DE BARREIRA, Tratado das significações das plantas, flores, e frutos que se referem na Sagrada Escritura, Alcalá, Lisboa 2005, 195-196

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