É OUTRA VEZ NOVEMBRO
Novembro 17, 2009
1. O tempo em que vamos parece o de Thomas Hobbes, quando, em 1651, deixou escrito no seu famoso Leviatã, que «tudo o que existe tem três dimensões, a saber, comprimento, largura e altura, e aquilo que não tem três dimensões não existe nem está em parte alguma». Com este procedimento, Hobbes, e alguns dos nossos contemporâneos com ele, reduzem o homem a um objecto, sem alma nem emoções, sem alegria nem tristeza, sem encanto e sem sonho, sem Deus. É um homem à medida do cadáver, e um mundo à medida do cemitério, tudo formatado e tresandando a amoníaco. É o mundo do «dois vezes dois são quatro», de que fala Dostoievski nos seus Cadernos do Subterrâneo, acrescentando logo, em jeito de confissão: «O homem sempre teve medo deste dois vezes dois são quatro, e eu também tenho».
2. Na esteira do grande escritor russo, vale a pena mostrar aqui um extracto das recentes e densas análises de O Método, de Edgar Morin: «O dogma da simplificação que contém a morte continua a impor-se por aí como verdade científica (…), e continua a rejeitar para fora do saber aquilo que resiste ao seu controlo. E os defensores deste dogma – continua Edgar Morin – vêem-nos como miseráveis, pedintes, esgadanhando os dejectos das suas lixeiras». E acrescenta depois de forma contundente: «Num sentido, eles têm razão: nós queremos recuperar e reciclar os dejectos que a sua ciência expulsa: não apenas o incerto, o impreciso, o ambíguo, o paradoxal, a contradição, mas também o ser, a existência, o indivíduo, o sujeito. Julgam deitar fora os excrementos do saber: não sabem que atiram para o lixo o ouro do tempo».
3. Nada de novo. Seis séculos a. C., já o filósofo grego Heraclito deixava escrito, no seu Fragmento 9, que «Os burros preferem a palha ao ouro». E já no nosso tempo, Martin Heidegger, debruçando-se, nos seus Ensaios e Conferências, sobre a referida sentença de Heraclito, pôde lê-la para nós, explicitando que este «ouro» depreciado é «o brilho não visto da claridade, e não se deixa agarrar, porque ele próprio não agarra», porque não é do domínio da posse, não obedece à regra das três dimensões.
4. Anda hoje outra vez por aí muito badalada a cultura das três dimensões. E é nesse sentido que dos hospitais se pretende retirar os capelães, porque aos doentes, reduzidos a três dimensões, bastam os cuidados técnicos que lhes são prestados por técnicos, da mesma forma que das escolas se pretende retirar os crucifixos, porque às crianças basta o alfabeto, a tabuada e a fita métrica, e a Igreja deve ser marginalizada, silenciada e banida como verdadeira fonte de ignorância, dado que o que diz e faz está para além das três dimensões, e já se decretou que o que não tem três dimensões não existe nem está em parte alguma.
5. Mas Novembro entra-nos outra vez em casa. E, não se sabe bem porquê, também os defensores da cartilha das três dimensões aparecem a visitar o cemitério e a depor flores nos túmulos dos seus familiares e amigos. E até, muito provavelmente, entrarão em alguma Igreja. Novembro é habitado por um silêncio gritante. Um silêncio que nunca se calou. E as flores, carregadas de sentido, mas silentes, são sempre as últimas a deixar o cemitério. Sim, porque, que se saiba, o sentido nunca fez barulho, nunca faz barulho. Um texto, por exemplo, é letra e som. Mas quando o interpretamos, não é a letra e o som que captamos, mas o sentido que habita essa letra e esse som. Afinal, por mais esforço que se faça, não é possível reduzir o homem a três dimensões. Há sempre uma flor ou uma lágrima, cujo sentido se chama amor, e que não é redutível a três dimensões.
6. Novembro lembra-nos outra vez que passamos muito tempo e que talvez gastemos até muitas energias a deitar para o lixo o ouro do tempo! Lembra-te, meu irmão de Novembro, que és pó e amor. E o amor não volta ao pó.
António Couto
quarta-feira, 18 de novembro de 2009
quarta-feira, 11 de novembro de 2009
Parabéns Bagão
António Bagão Félix>>
Público, 20091024>>
Não sou apreciador da escrita de José Saramago, mas não desconsidero a> sua obra literária.>> Como autor e cidadão, José Saramago tem todo o direito de exprimir as> suas ideias sobre tudo e mais alguma coisa.>> E, naturalmente, de expressar com clareza, frontalidade e liberdade o> seu ateísmo militante. Seja nos seus livros, seja nos seus ditos.>> Mas para se ser respeitado nas suas opiniões, é preciso ter-se a> inteligência, a razoabilidade e a prudência de se dar ao respeito.>> Uma coisa é Saramago defender o seu pensamento livre. Outra é o modo> como o faz. Com acidez, arrogância, intolerância e sectarismo> extremos.>> Pretensamente auto-dotado de uma superioridade intelectual e moral> desde que foi galardoado com o Nobel acha-se pateticamente acima dos> outros. Por isso, não argumenta, agride. Não opina, sentencia. Não> confronta, insulta. Não esclarece, obscurece. Não convoca, provoca.> Não fundamenta, opta pelo fundamentalismo.>> O curioso é que, depois de tudo o que diz e escreve com a liberdade de> que, aliás, felizmente dispõe, estranha as posições de quem o> confronta. Nada que me espante, sabendo-se do modo como tratava os> "delitos de opinião", por exemplo, quando foi director de um jornal.>> José Saramago é um paradoxo: é religiosamente anti-religioso. O seu> proselitismo é a expressão de uma nova moda religiosa: o ateísmo> pretensamente humanista.>> Saramago acaba de editar mais um livro e aproveita a ocasião para um> diktat gratuito tão ao seu gosto pessoal. A Deus tudo culpa, a Deus> chama tudo o que de mal possa haver, ao mesmo tempo que diz não> existir. Em que ficamos?>> A Bíblia, para ele, é um manual de maus costumes e um catálogo de> crueldades, num recorrente certificado de menoridade antropológica do> próprio homem. Não percebe que a Bíblia (e sobretudo o Antigo> Testamento) é também a história da condição humana feita de luz e de> sombras, do bem e do mal que coexistem por conta da liberdade humana.> Deus não nos fez robots. Logo a seguir a Caim e Abel, Deus diz "Meu> espírito não se responsabilizará indefinidamente pelo homem" (Génesis> 6,3).>> Saramago olha para a Bíblia e interpreta-a rudemente à letra, sem> contextualização, como se estivesse a ser escrita agora. Só lhe falta> um Deus a comunicar por telemóvel.>> Saramago odeia visceral e mefistofelicamente a ideia de Deus e dos> Livros Sagrados. Está no seu direito. Mas revê-se no estalinismo, nos> seus gulags e pogroms, para ele, por certo, ícones dos bons costumes e> das boas práticas.>> Saramago é um incompreendido. Nega um Deus (que, apesar de não> existir, é a causa de todos os males.) que, todavia, não é capaz de> esquecer. Deus não existe mas não lhe sai do pensamento. Estranho, não> é? À conta deste pesadelo, decreta impositivamente um atestado de> quase insanidade sobre os que, para si incompreensivelmente, crêem em> Deus. Saramago procura chamar à realidade milhões e milhões de pessoas> que, ao longo dos tempos, vivem nas trevas, sem inteligência e> discernimento, manipuladas por um Deus menor. Cautelosamente, o Deus> menor da Bíblia que não o do Corão .>> Enquanto católico, não sou nem mais nem menos pessoa do que Saramago.> Mas tenho o direito à defesa dos valores em que acredito. Não me> revejo nos arautos da atitude política e religiosamente correcta que,> com calculista "respeitinho" pelo Nobel, se remetem a uma espécie de> coligação do silêncio. Como também não perfilho a ideia da indiferença> ou da contrafacção da religião. A fé é um acto de liberdade porque sem> liberdade não haveria qualquer mérito em crer.>> Que esta polémica de puro marketing tenha pelo menos a vantagem de> levar mais cristãos a ler ou reler a Bíblia. Só por isso agradeço a> Saramago.>> Quanto ao resto, a publicidade não é uma medida divina. Deus é> misericordioso e perdoa a Saramago.>>
Público, 20091024>>
Não sou apreciador da escrita de José Saramago, mas não desconsidero a> sua obra literária.>> Como autor e cidadão, José Saramago tem todo o direito de exprimir as> suas ideias sobre tudo e mais alguma coisa.>> E, naturalmente, de expressar com clareza, frontalidade e liberdade o> seu ateísmo militante. Seja nos seus livros, seja nos seus ditos.>> Mas para se ser respeitado nas suas opiniões, é preciso ter-se a> inteligência, a razoabilidade e a prudência de se dar ao respeito.>> Uma coisa é Saramago defender o seu pensamento livre. Outra é o modo> como o faz. Com acidez, arrogância, intolerância e sectarismo> extremos.>> Pretensamente auto-dotado de uma superioridade intelectual e moral> desde que foi galardoado com o Nobel acha-se pateticamente acima dos> outros. Por isso, não argumenta, agride. Não opina, sentencia. Não> confronta, insulta. Não esclarece, obscurece. Não convoca, provoca.> Não fundamenta, opta pelo fundamentalismo.>> O curioso é que, depois de tudo o que diz e escreve com a liberdade de> que, aliás, felizmente dispõe, estranha as posições de quem o> confronta. Nada que me espante, sabendo-se do modo como tratava os> "delitos de opinião", por exemplo, quando foi director de um jornal.>> José Saramago é um paradoxo: é religiosamente anti-religioso. O seu> proselitismo é a expressão de uma nova moda religiosa: o ateísmo> pretensamente humanista.>> Saramago acaba de editar mais um livro e aproveita a ocasião para um> diktat gratuito tão ao seu gosto pessoal. A Deus tudo culpa, a Deus> chama tudo o que de mal possa haver, ao mesmo tempo que diz não> existir. Em que ficamos?>> A Bíblia, para ele, é um manual de maus costumes e um catálogo de> crueldades, num recorrente certificado de menoridade antropológica do> próprio homem. Não percebe que a Bíblia (e sobretudo o Antigo> Testamento) é também a história da condição humana feita de luz e de> sombras, do bem e do mal que coexistem por conta da liberdade humana.> Deus não nos fez robots. Logo a seguir a Caim e Abel, Deus diz "Meu> espírito não se responsabilizará indefinidamente pelo homem" (Génesis> 6,3).>> Saramago olha para a Bíblia e interpreta-a rudemente à letra, sem> contextualização, como se estivesse a ser escrita agora. Só lhe falta> um Deus a comunicar por telemóvel.>> Saramago odeia visceral e mefistofelicamente a ideia de Deus e dos> Livros Sagrados. Está no seu direito. Mas revê-se no estalinismo, nos> seus gulags e pogroms, para ele, por certo, ícones dos bons costumes e> das boas práticas.>> Saramago é um incompreendido. Nega um Deus (que, apesar de não> existir, é a causa de todos os males.) que, todavia, não é capaz de> esquecer. Deus não existe mas não lhe sai do pensamento. Estranho, não> é? À conta deste pesadelo, decreta impositivamente um atestado de> quase insanidade sobre os que, para si incompreensivelmente, crêem em> Deus. Saramago procura chamar à realidade milhões e milhões de pessoas> que, ao longo dos tempos, vivem nas trevas, sem inteligência e> discernimento, manipuladas por um Deus menor. Cautelosamente, o Deus> menor da Bíblia que não o do Corão .>> Enquanto católico, não sou nem mais nem menos pessoa do que Saramago.> Mas tenho o direito à defesa dos valores em que acredito. Não me> revejo nos arautos da atitude política e religiosamente correcta que,> com calculista "respeitinho" pelo Nobel, se remetem a uma espécie de> coligação do silêncio. Como também não perfilho a ideia da indiferença> ou da contrafacção da religião. A fé é um acto de liberdade porque sem> liberdade não haveria qualquer mérito em crer.>> Que esta polémica de puro marketing tenha pelo menos a vantagem de> levar mais cristãos a ler ou reler a Bíblia. Só por isso agradeço a> Saramago.>> Quanto ao resto, a publicidade não é uma medida divina. Deus é> misericordioso e perdoa a Saramago.>>
domingo, 1 de novembro de 2009
Altar do Santíssimo restaurado e móvel da sacristia da Igreja matriz de Sambade
Finalmente o altar onde ficará o Santíssimo Sacramento e também alguns móveis da sacristia da Igreja matriz de Sambade froam restaurados.
Naturamente que sem a ajuda dos paroquianos de Samaba de e outros amigos não seria possível esta empreitada.
Aqui vão algumas imagens da Igreja mais bela do concelho de Alfândega da Fé
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